O ex-presidente do Instituto da
Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) afirmou hoje que a Comissão de
Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Centro não verificou “no
local” quais as habitações danificadas pelos incêndios de 2017, em Pedrógão Grande.
“Percebe-se pela leitura da auditoria do Tribunal de Contas que a comissão
técnica do Fundo Revita não realizou um trabalho ‘in loco’ aos processos, não
foi visitar os locais e verificar a parte documental que lhe era presente”,
afirmou Victor Reis.
O arquitecto falava na Comissão
Eventual de Inquérito Parlamentar à actuação do Estado na atribuição de apoios
na sequência dos incêndios de 2017 na zona do Pinhal Interior, onde considerou
que o afastamento do IHRU e a coordenação da CCDR “é uma das origens para a
situação a que se chegou”. “É uma situação muito complicada de gerir, colocando
os processos nas mãos de uma entidade cuja vocação não é lidar com reconstrução
de casas, com reconstrução de obras públicas e isto não é uma crítica, tem a
ver com competências. Foi criada uma situação completamente nova que, para quem
estava na CCDR, foi um problema sério”, apontou.
Victor Reis referia-se à aplicação
de um novo regulamento, o Fundo Revita, que permitia que o domicílio fiscal
pudesse ser “um elemento probatório de uma habitação permanente, quando ainda
por cima não é exigido que o fosse à data do incêndio”. “Há casos de pessoas
que tinham domicílio fiscal em Lisboa, a casa foi atingida pelo incêndio,
mudaram o domicílio fiscal para Pedrógão Grande, obtiveram o apoio e mudaram a
casa, mas após ter sido concluído voltaram a mudar o domicílio fiscal para
Lisboa”, revelou. Segundo o responsável, esta situação tornou-se num “alçapão
que permite fazer um truque”, em que “nem todos tiveram conhecimento desta
artimanha que estava no regulamento”.
A comissão pretende averiguar a
atribuição indevida de apoios em três concelhos, mas o responsável indicou que
“não há nem em Castanheira de Pêra nem em Figueiró dos Vinhos o que há em
Pedrógão Grande”, onde há pressupostos que foram “amplamente violados”. “Há
casas em ruína e ao abandono que foram tratadas como primeira habitação, casas
de segunda habitação que foram tratadas como primeira habitação, casas que
foram tratadas como se tivessem sido danificadas pelo incêndio”, mencionou.
Já em Maio de 2019, o responsável
tinha afirmado numa comissão parlamentar de Agricultura e Mar, requerida pelo
CDS-PP, que existiam 46 situações de irregularidades no processo de
reconstrução de casas em Pedrógão Grande. Apesar de algumas dúvidas dos grupos
parlamentares, sobretudo do PS, Victor Reis afirmou que a maior parte dos casos
de irregularidades “são situações propositadas”. “Há várias passagens da
acusação do Ministério Público onde é dito que há uma clara intenção por parte
do presidente da câmara e do vereador de, concertadamente, criarem uma situação
de fraude que conduziu à burla e muitas destas pessoas ao engano”, frisou. Na
visão do arquitecto, trata-se de uma questão de “equidade” em que a algumas
pessoas “foi dito que podem mudar o domicílio fiscal para ter um tratamento e
omitido a outros”.
Victor Reis ocupou o cargo de
presidente do IHRU entre 2012 e 2017, tendo acompanhado a fase inicial do
processo de reconstrução de casas afectadas pelo incêndio de 17 de Junho de
2017 em Pedrógão Grande. Segundo o responsável, a única participação do IHRU no
processo aconteceu durante seis dias, logo após os incêndios, para fazer o
“levantamento de tudo o que o que tinha a ver com construções habitacionais”,
com a indicação de que seria necessário regressar ao terreno para completar o
levantamento.
Já em relação ao seu papel na
denúncia desta situação, Victor Reis esclareceu que “dedicou a vida
profissional às questões da habitação e reabilitação urbana” e que a questão de
Pedrógão Grande o tocou particularmente por ser a sua segunda terra, tendo
recebido várias denúncias. “Isto não tem a ver com ideologias nem com cores,
tem a ver com um estado de direito democrático”, sublinhou.
O incêndio que deflagrou em 17 de
Junho de 2017 em Escalos Fundeiros, no concelho de Pedrógão Grande, e que
alastrou depois a municípios vizinhos, nos distritos de Leiria, Coimbra e
Castelo Branco, provocou 66 mortos e 253 feridos, sete deles com gravidade, e
destruiu cerca de 500 casas, 261 das quais eram habitações permanentes, e 50
empresas.
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Fonte: SAPO Notícias
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