quinta-feira, 26 de outubro de 2006

562. Quarta-feira, 25 de Outubro (Recortes da imprensa - III)

Temporal de destruição
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Um autocarro foi arrastado ontem pelas águas do Rio Arunca, com 52 alunos de duas escolas de Soure. As crianças ficaram retidas no meio da estrada entre as povoações de Simões e Netos. Foi um dos momentos mais dramáticos causados pelo mau tempo que assolou, sobretudo, a região Centro e provocou dois mortos e um ferido grave.
Os alunos do 5.º ao 12.º ano da Escola Secundária Martinho Árias e Escola E.B. 2,3 de Soure ficaram em estado de choque. “Podia ter acontecido aqui uma tragédia igual à de Entre-os-Rios”, diz uma mãe de um casal de gémeos de 11 anos, que soube do drama pelo filho, que lhe telefonou eram 08h03. As crianças foram retiradas mais tarde – às 10h30 ainda decorriam as operações – pelo vidro traseiro do autocarro, com a ajuda dos bombeiros de Soure, populares e pais.
Com a ajuda de uma corda formaram um cordão humano para trazer os alunos para a margem. O motorista do autocarro foi retirado de helicóptero. Um aluno, de 15 anos, lembra: “Os mais novos entraram em pânico e começaram a gritar.” Segundo o mesmo estudante da Escola Martinho Árias, “o motorista não deu ouvidos aos nossos pedidos para não seguir e disse que ia arriscar”.
A água chegou até meio do autocarro – junto às letras – e ficou preso numa oliveira, o que impediu que continuasse a ser arrastado e uma tragédia.“Tive medo que o autocarro explodisse, porque começou a deitar fumo e fiquei muito assustado”, referiu outro rapaz, de onze anos, logo interrompido por uma rapariga de 12 anos: “Com este motorista não ando mais. Pensei que íamos morrer afogados.”
Os pais estão revoltados com a falta de cuidado do motorista da Câmara Municipal de Soure. “Podia ter acontecido uma grande tragédia e de quem era a culpa? Os meus filhos não voltam a andar com ele, nem que tenha de ir levá-los a Soure”, afirma a mãe de uma aluna de 12 anos.
CIDADE CAÓTICA - Em Pombal, as cheias causaram a morte de uma mulher de 86 anos e deixaram um rasto de destruição – o centro da cidade ficou dois metros debaixo de água, 40 famílias foram retiradas para local seguro, o ‘shopping’ esteve em risco de ruir, as escolas e o centro de saúde fecharam e a ETAR do concelho não funciona. “Os prejuízos são incalculáveis”, reconheceu o presidente da Câmara Municipal, Narciso Mota.
Quando o temporal de chuva e vento atingiu o concelho, à 01h00, uma senhora encontrava-se sozinha na sua habitação, um rés-do-chão na Rua da Cancela do Cais. Segundo contou o filho, a água subiu até ao tecto, matando a mulher, de 86 anos. “Ou morreu afogada ou do susto”, disse. Sete vizinhos foram resgatados de barco, mas os bombeiros desconheciam que a idosa estava em casa e descobriram-na já sem vida.
FÁTIMA - Uma senhora, de 51 anos, ficou gravemente ferida numa explosão quando tentava abrir o portão da garagem inundada, onde estava acumulado vapor de gasolina. A tromba-d’água originou enxurradas e fez transbordar ribeiras e o Rio Arunca. Só a partir das 05h00 o nível começou a descer.
Há pontes em risco, passeios arrancados, muros destruídos e buracos nas estradas devido a aluimentos de terras. Houve viaturas submersas e dezenas de inundações em habitações, lojas e também na biblioteca e arquivo municipal, no edifício da autarquia, no cine-teatro, no pavilhão de actividades económicas e toda a zona desportiva. “Já tínhamos visto em filmes, mas nunca pensámos que acontecesse aqui”, disse o comandante dos Bombeiros Voluntários.
“As ruas pareciam rios e os carros eram arrastados com facilidade.” As garagens do quartel ficaram inundadas, obrigando a pedir meios a outras corporações. O hospital esteve inacessível por duas horas e o centro de saúde fechou até ao fim da semana. Numa casa, a pressão fez explodir uma conduta de águas pluviais, o que destruiu o jardim e vedações e inundou as garagens. Um senhor, de 78 anos, viu a sua tanoaria com água até dois metros. “Há para aí danos que Deus me livre”, queixou-se.
QUEDA FATAL - Na Sertã, uma mulher de 63 anos morreu depois de cair de um pontão para a Ribeira da Cerdeira, em Milheiros. O acidente aconteceu às 18h10, numa altura em que chovia e fazia vento. Segundo os bombeiros, a senhora, residente em Castelo, estava com outra mulher no pontão quando escorregou e caiu na ribeira, que devido à chuva que caiu de madrugada tinha um grande caudal de água.
“Quando chegámos ao local, a mulher estava inanimada e com fracos sinais de vida. Procedemos a operações de reanimação e depois levámo-la para o Centro de Saúde da Sertã, onde já chegou sem vida”, contou o comandante dos Bombeiros Voluntários de Cernache de Bonjardim.
FÁTIMA - A uma explosão devido à acumulação de gases inflamáveis, na garagem de uma moradia inundada pelas águas da chuva, quase causou outra tragédia. Uma mulher, de 51 anos, ficou ferida com gravidade. Os danos na casa são avultados. A senhora sofreu diversas queimaduras, foi internada na Unidade de Queimados dos Hospitais da Universidade de Coimbra e não corre perigo de vida. Segundo o marido da vítima, o rebentamento deu-se pelas 04h00, quando os bombeiros procediam ao escoamento das águas. “Ela foi abrir o portão da garagem, com uma vela, quando se ouviu um estrondo”. Como lá estavam dois carros estacionados, suspeita-se que houve acumulação de gases, provocada pelo derrame de gasolina.
LEIRIA - Os moradores da Ponte das Mestras – o local mais atingido – não assistiam a uma inundação desta dimensão há quase duas décadas. As águas subiram mais de dois metros, extravasaram as margens do Rio Lena e inundaram empresas e habitações. Quatro dezenas de pessoas ficaram retidas e tiveram de ser retiradas de bote pelos bombeiros.
EMERGÊNCIA ACTIVADA NA BACIA DO TEJO:
TOMAR - Vinte famílias foram retiradas do Bairro do Flecheiro, em Tomar, devido à subida do Rio Nabão. Ficariam num ginásio escolar ou em instalações da autarquia, se fosse necessário.
PONTE - O pico do nível do Rio Nabão foi atingido pouco depois das 16h00, obrigando ao corte de uma ponte e ao fecho de uma rua em Tomar, onde a água atingiu os 60 centímetros.
BARRAGENS - As barragens do Fratel e de Castelo de Bode estão mais cheias e a barragem da Pracana atingiu ontem o limite máximo, mas o Tejo tem aguentado os caudais adicionais.
SANTARÉM - O plano distrital de cheias de Santarém foi activado ontem no nível azul, o mais baixo, estando os bombeiros de prevenção. A ponte do Alviela na EN365 estava submersa.
DIA DE CAOS EM LISBOA E ARREDORES - O Regimento de Sapadores Bombeiros (RSB) de Lisboa não teve mãos a medir durante a noite e o dia de ontem. Em dez horas, o RSB recebeu 180 pedidos por inundações, quedas de árvores, infiltrações e desabamentos e teve de empenhar todas as viaturas (25) para conseguir responder a tantas ocorrências.
Alguns dos alertas foram feitos do Alto do Lumiar, onde as caves dos prédios foram inundadas pela chuva. Os donos do café Tobísio, na Rua Eduardo Covas, foram chamados pelos vizinhos por causa da inundação. “Parecia o fim do mundo. Tinha a cave do café toda equipada, pronta a estrear como restaurante. Ficou tudo destruído”, disse ao CM uma das proprietárias. O problema, acusa, “é o sistema de escoamento dos esgotos, vem tudo parar aqui”. A água atingiu os três metros e deu, pelos menos, 53 mil euros de prejuízo aos donos.
Também o Centro Distrital de Operações de Socorro de Lisboa recebeu, entre a meia-noite de ontem e as 09h00, 176 pedidos por causa do mau tempo. Em Odivelas, a chuva causou inundações em vários pontos do concelho. “Há água por tudo o que é sítio”, descreveu o comandante dos Bombeiros locais.
No concelho de Loures, na Escola Secundária de Camarate, 700 alunos foram obrigados a regressar a casa devido a uma inundação que encheu a escola de lama. A presidente do Conselho Directivo disse que a inundação causou prejuízos não contabilizados em dois laboratórios da escola e que o chão terá de ser substituído. A inundação, que também deixou os alunos sem almoço, ocorreu devido às fortes chuvadas da noite passada que arrastaram terras das obras do Eixo Norte/Sul em curso nas traseiras do estabelecimento de ensino, frequentado por muitos alunos carenciados – que só têm uma refeição na escola.
SETÚBAL - Em Setúbal, durante a madrugada, o Centro de Operações Distrital de Setúbal, registou 96 inundações e 25 quedas de árvores. O coordenador da Protecção Civil Municipal, José Luís Bucho, caracterizou o temporal como “extraordinário, pela quantidade de água que caiu: 48,2 litros por metro quadrado, e porque a chuva intensa coincidiu com a maré a encher”.
BRAGANÇA - Em Vila Flor houve muros caídos, viaturas soterradas e inundações. A água atingiu 1,20 m, como o comprova a marca no restaurante Don Castro. ÀGUEDA - O Rio Águeda transbordou e inundou várias ruas da Baixa da cidade. As estradas para Recardães, Sardão, Oronhe e Perrães estiveram intransitáveis durante grande parte do dia.
FUNDÃO - A chuva forte derrubou o muro do cemitério de Castelejo, no Fundão, tendo destruído vários jazigos e deixado a descoberto cinco urnas.
COIMBRA - As zonas mais afectadas foram a ‘Baixinha’, Fornos e Ribeira de Frades. Registaram-se inundações em casas e lojas e desabamentos de terras.
PORTIMÃO - Uma casa ruiu parcialmente na Praia da Rocha, deixando um idoso desalojado que foi realojado numa pensão pela câmara.
VILAMOURA - O temporal deitou por terra um pré-fabricado do Clube de Râguebi de Vilamoura. Houve ainda várias casas destelhadas.
LISBOA - Na Rua Tomás Ribeiro, em Lisboa, as varandas de um prédio devoluto ruíram. No local estiveram os bombeiros e uma equipa cinotécnica da PSP, por suspeita de haver pessoas sob os destroços das varandas. No entanto, não se registaram feridos.
GUIA, ALBUFEIRA - O temporal danificou o Giga-Garden. A estufa gigante, que custou 1,2 milhões de euros, foi concebida “para suportar ventos muito fortes, mas mesmo assim não resistiu”, afirma o dono, Antonius Verhoeven. Os prejuízos atingem “100 mil euros”.
RIO LIS - O centro de lançamentos da zona desportiva de Leiria ficou submerso pela subida repentina das águas do Lis. Parte da ciclovia ribeirinha, construída pelo Programa Polis, também foi atectada pelas cheias. O trânsito esteve caótico nas principais entradas da cidade.
COIMBRA - O IC2 esteve cortado ao trânsito toda a manhã, em Coimbra, devido à inundação do nó dos Fornos, em Torre de Vilela. O corte originou uma fila que se prolongou por cinco quilómetros.
LINHA FERROVIÁRIA DO NORTE - A linha ferroviária do Norte esteve ontem cortada durante cinco horas na zona entre Souselas e Coimbra B, devido ao mau tempo.
COIMBRA: CHUVA BATE RECORDE - Na madrugada de ontem, entre a 01h00 e as 03h00, choveram em Coimbra 105 litros de água por metro quadrado. Estes índices quebraram um recorde histórico.
MONTE REAL - Uma ruptura num canal do sistema de escoamento de águas, próximo de Monte Real, Leiria, ameaçou algumas habitações. O rombo foi reparado ao fim da tarde.
GUARDA - Quatro das cinco salas do bloco operatório do Hospital Sousa Martins, na Guarda, foram ontem encerradas devido a infiltrações de água. Foram canceladas várias cirurgias. Duas famílias de Vila Soeiro e Famalicão abandonaram as suas casas porque ficaram inundadas. A chuva destruiu as praias fluviais de Valhelhas e Aldeia Viçosa.
DESALOJADOS EVACUADOS - Uma família de S. Martinho do Bispo, Coimbra, teve de ser realojada. Em Porto de Mós, cinco pessoas tiveram de ser evacuadas durante a madrugada.
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Fonte:
Correio da Manhã

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