sábado, 4 de abril de 2009

2372. Mais de 100 a mandar na costa

Fustigada por ventos e marés e também pela acção do homem, a costa portuguesa continua a aguardar uma Estratégia Nacional, que tarda em sair. Prometida desde 2005 pelo ministro do Ambiente, a dita Estratégia seguiu para consulta junto da Comissão Interministerial para os Assuntos do Mar e do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável. O objectivo é tê-la aprovada até ao Verão.
Perto de uma centena de entidades (11 ministérios, nove secretarias de Estado, 36 institutos e direcções-gerais e 49 municípios) pronunciam-se actualmente sobre o que se passa no litoral. E vão continuar a fazê-lo. Esta fragmentação de competências tem sido criticada por permitir "uma política de dividir para reinar".
Porém, segundo o secretário de Estado do Ordenamento do Território, "concentrar tudo numa única entidade não seria a solução". A proposta na mesa não visa extinguir esta dispersão, mas "identificar as prioridades do modelo de governação para o litoral", esclarece João Ferrão. Para ele, o importante é definir "uma visão partilhada e coerente entre todas estas entidades". E que visão é essa? Esclarece: "a da prevenção" face a três problemas: o défice de sedimentos que chega ao litoral, a subida do nível do mar e a ocorrência de fenómenos extremos. Os esclarecimentos ficam para o Verão.
Para já, está em marcha o Plano de Acção para o Litoral 2007-2013 que conta com um investimento total de €550 milhões. O objectivo é enfrentar a erosão costeira, acautelar as situações de risco já identificadas e requalificar praias e zonas costeiras. As obras de defesa costeira pura e dura representam 67% das intervenções previstas.
Mas, até agora, apenas 3 em 57 estão concluídas e 28 em andamento. Porém, tal não sabe a pouco a João Ferrão: "O plano só foi aprovado em 2007 e vai-se gastar mais em média em seis anos (€92 milhões por ano) do que se gastou no total dos oito anos anteriores (€99 milhões)". Até 2010, tencionam executar 50% do programado.
Porém, para alguns especialistas em litoral contactados pelo Expresso, o que se está a fazer "é mais do mesmo", tudo assente na linguagem de sempre: requalificação, demolições e obras de engenharia pesada. Investigadores como Helena Granja (Universidade do Minho), Carlos Sousa Reis (Lisboa) ou Alveirinho Dias (Algarve) criticam estes "remendos desligados de um todo" e o facto de haver uma diferença entre as palavras e a prática, na qual não conhecem "nada de coerente, apenas acções avulsas". E alertam para o paradoxo de no papel as políticas de ordenamento costeiro impedirem a construção a menos de 500 metros da costa, mas continuarem a surgir autorizações para construções em zona de risco.
Barragens agravam erosão costeira – "A erosão costeira em Portugal deve-se em mais de 80% dos casos à diminuição de sedimentos que chegam ao litoral por acção humana" afirma Alveirinho Dia, da Universidade do Algarve. A ideia é partilhada por outros especialistas contactados pelo Expresso.
A culpa reside sobretudo na construção de barragens que impedem a chegada das areias à costa e de esporões, que para protegerem edificações a norte agravam a erosão a sul. Um dos últimos esporões a ser erguido (Mira) já obrigou a obras de emergência na praia a sul. E o Estado foi recentemente forçado a pagar uma indemnização a um particular porque se provou que o avanço do mar (que colocou a sua casa em risco) se deveu à existência de um esporão (Pedrinhas/Apúlia).
No caso das barragens, o problema é que estas são projectadas sem que os Estudos de Impacte Ambiental tenham em conta as consequências costeiras. Recorde-se que estão projectadas 15 novas barragens e que nenhuma assume esta relação de causa-efeito.
Plano de acção 2007-2013 - Apenas 8,3% das intervenções (7 em 84) identificadas como prioritárias foram executadas até agora. E 42% (35) estão em execução. Três em 57 obras de defesa costeira estão concluídas e 28 a ser feitas. E 17 praias em 80 foram requalificadas até agora (26 estão a sê-lo) no âmbito dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira. O Plano deve ser revisto bianualmente
Os três Polis do Litoral – Norte, Ria de Aveiro e Ria Formosa – envolvem 18 intervenções de requalificação e renaturalização em 18 municípios ao longo de 158 quilómetros de frente de costa e 215 quilómetros de frente estuarina. Estas obras correspondem a 21% das prioridades do Plano e são geridas pelas respectivas Sociedades Polis e a Parque Expo
Entre 2006 e 2008 foram executadas 159 demolições entre Caminha e Vila Real de Santo António. Trata-se, na sua maioria, de estruturas de apoio de praia, vedações ilegais ou barracões de apoio de pesca, mas também de quatro habitações. As demolições são um processo moroso que defronta dois obstáculos: um legal (providências cautelares) e outro social (quando é primeira habitação)
Investimentos:
€550 milhões é a verba que o Ministério do Ambiente prevê investir em obras de defesa costeira e valorização do litoral até 2013. Cerca de €300 milhões provêm de fundos comunitários (Feder e Fundo de Coesão). Destes, €57,2 milhões já foram aprovados por Bruxelas;
€48,2 milhões é o investimento previsto das 31 intervenções (3 já executadas e 28 em execução) de combate à erosão e defesa costeira em zonas de risco;
€275,5 milhões estão destinados às obras de requalificação e de renaturalização projectadas pelos três Polis do Litoral - Norte, Ria de Aveiro e Ria Formosa. Tal representa cerca de metade do total de investimento previsto;
€99 milhões foram gastos em obras de defesa costeira e de requalificação do litoral entre 1998 e 2005. Se executado como previsto, o actual Plano de Acção envolverá um investimento médio anual de €92 milhões entre 2008 e 2013.
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Fonte: Expresso

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