sábado, 23 de agosto de 2008

1958. Torres de vigia: Olhos atentos são segredo para vigiar fogos

Os olhos do jovem vigia Frederico ainda são traídos pelas luzes durante a noite, levando-o a crer que está a ver focos de incêndio, mas o experiente Vasco há muitos anos que não se deixa cair nesses equívocos. Ambos integram o grupo de 670 pessoas que, em todo o país, optaram por passar o Verão no cimo de uma torre de vigia, da responsabilidade do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, atentos ao vasto território que os rodeia. Televisões e computadores portáteis são proibidos para ajudar a passar o tempo, porque a ordem é para estarem vigilantes a qualquer incidente.
Frederico Fernandes, de 26 anos, é um dos três voluntários responsáveis pela torre de vigia do Monte de Santa Luzia, em Viseu, a mais alta do distrito com 32 metros de altura, uma estrutura metálica que se torna instável em dias de vento. Além de ser um posto de vigia de onde se avistam zonas do território que outros não conseguem alcançar – até às Serras do Caramulo, da Estrela e de S. Macário e mesmo do distrito de Coimbra, em dias sem névoa – tem também uma vista privilegiada da zona urbana de Viseu. É aí que residem as principais dificuldades de Frederico, que decidiu ser vigia porque se encontrava desempregado, apesar do curso de Documentação e Arquivística.
"Sinto dificuldades principalmente à noite, em que é mais difícil identificar um foco de incêndio, sobretudo na zona urbana, porque existem muitas luzes", afirmou à Agência Lusa. Enganos acontecem com frequência, sobretudo com aqueles que são vigias pelo primeiro ano. Há também quem se confunda com o fumo saído das chaminés das fábricas e com a poeira levantada pelo vento. "Tivemos muitas situações dessas na Mealhada. Chegámos à conclusão que era sempre quando um restaurante ia assar os leitões. Depois já sabíamos: quando se via fumo àquela hora, era o leitão a ir para o forno", contou, divertido, o capitão João Fernandes, coordenador do SEPNA na Região Centro.
Vasco Costa, do alto dos 12 metros do seu moderno posto de vigia monotubular de Poisadas, Chãs de Tavares, Mangualde, já não se deixa cair nesses enganos. "Isso comigo já não acontece. Só se tiver havido um fogo e, daí a um ou dois dias houver um remoinho que parece mesmo um incêndio. Mas quando pego nos binóculos vejo logo que não é", disse, confiante, o homem de 53 anos, que é vigia "há 20 e tal". Vasco afirmou estar muito satisfeito com a nova torre de vigia (colocada a meia dúzia de metros da antiga), que tem uma porta anti-intrusão, telhado com isolamento térmico e 360 graus de janelas móveis, além da sempre necessária casa de banho para quem cumpre um horário de oito horas.
Apesar das diferenças das torres, os equipamentos e procedimentos para detectarem e comunicarem os incêndios à Equipa de Manutenção e Exploração da Informação Florestal (EMEIF) da GNR são os mesmos. Há um primeiro posto de vigia que sinaliza a ocorrência, usando a mesa de ângulos com monóculo para tirar o azimute e a localizar. Depois, os elementos da EMEIF recebem a informação via rádio vão ter de fazer a "triangulação", ou seja, a validação, pedindo a confirmação a outros postos de vigia (habitualmente mais dois). Os dados são remetidos ao Comando Distrital de Operações de Socorro (CDOS), que faz avançar os meios necessários para o terreno.
Durante a reportagem da Lusa, Vasco foi chamado a dar informações sobre uma coluna de fumo na zona de Oliveirinha para a qual um popular tinha dado o alerta, mas que estava a ser difícil de localizar. Segundos depois questionava-se se seria em Lapa do Lobo. "A confusão foi que ocorreram dois incêndios ao mesmo tempo, coisas pequenas", justificou mais tarde Victor Pires, operador da EMEIF. Marília Moita, do CDOS de Viseu, confirmou. Tudo ficou resolvido entre as 11:50 e as 12:25, com 38 bombeiros, nove viaturas e dois meios aéreos.
Mas como nem sempre assim acontece, a experiência já mostrou a Vasco Costa como agir: "já fugi algumas vezes daqui por causa do fogo. Se tivermos que morrer, que não seja cá em cima".
Ana Maria Ferreira e Paulo Novais
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