O dia 15 de Outubro foi considerado o “pior dia do ano” em termos de fogos florestais, com a Protecção Civil a registar 443 ocorrências. As centenas de fogos que deflagraram provocaram 45 mortos e cerca de 70 feridos, dezenas dos quais graves. As chamas obrigaram a evacuar várias localidades, a realojar populações e a cortar várias estradas. Mais de 800 habitações permanentes e quase 500 empresas ficaram destruídas. Na região centro os incêndios consumiram extensas áreas florestais.
Alguns dos incêndios começaram a lavrar na noite de sábado, 14 de Outubro. Às 8h00 de domingo, a Protecção Civil dava conta de que mais de 500 operacionais combatiam cinco incêndios considerados “preocupantes”. Mais de 80 concelhos, de 15 distritos, apresentavam risco máximo de incêndio.
As chamas consumiam o concelho de Seia, no distrito da Guarda, Lousã (Coimbra), Vieira do Minho (Braga), Cinfães (Viseu), e Monção (Viana do Castelo). No entanto, durante a manhã a situação agravou-se e ao início da tarde Monção activou o plano municipal de protecção civil e em Melgaço as chamas obrigaram à evacuação do lugar de Lobiô Roussas.
Na localidade de Merufe, Monção, pelas 15h00, as chamas que estavam a ser combatidas mais de 180 operacionais tinham provocado quatro feridos ligeiros e o lar de idosos de Barbeita estava em vias de ser evacuado. O comandante dos bombeiros voluntários afirmava à RTP que o “vento forte” dificultava o combate ao incêndio “que surgiu no incremento de cinco ocorrências”. Em Valença, o presidente da Câmara afirmava que o incêndio “estava a tomar proporções alarmantes”.
Na localidade de Santo António, Lousã, as chamas consumiram uma antiga fábrica de papel e o vice-presidente da Câmara afirmava que existiam “várias populações em risco”. Luís Antunes frisava que a “situação” estava “descontrolada”.
Na Sertã, várias pessoas foram retiradas das aldeias de Ermida e Figueiredo. José Nunes, presidente da Câmara, afirmava que “o fogo havia tomado grandes proporções, propagando-se a grande velocidade". O presidente da Câmara de Seia, Carlos Filipe Camelo, apontava “mão humana” como a causa do incêndio que tinha deflagrado de madrugada no Sabugueiro. No concelho, as chamas destruíram o pavilhão de uma empresa têxtil.
Ao início da tarde sete estradas, nas regiões norte e centro, estavam cortadas ao trânsito. Às 17h30 a Protecção Civil afirmava que se estava “a viver o pior dia do ano em matéria de incêndios florestais”. A essa hora estavam activos 88 incêndios. Patrícia Gaspar, adjunta nacional de operações da Protecção Civil, revelava que já tinha sido “ultrapassada a marca dos 300 incêndios florestais”. O parque de campismo da Praia da Tocha em Cantanhede foi evacuado na sequência de um incêndio que começou em Quiaios, Figueira da Foz.
Ao final da tarde, o secretário de Estado da Administração Interna afirmava que os incêndios que consumiam a região norte e centro tinham origem criminosa. "As áreas onde há pastorícia estão todas a arder. Isto não é por acaso", dizia Jorge Gomes. Questionado se considerava que os incêndios desse domingo tinham origem criminosa, o secretário de Estado respondeu: "Sim". "Não se põe um país arder de um dia para outro só porque se anunciou que amanhã [segunda-feira] vai haver chuva. Como vai haver chuva, os pastos estão proibidos de fazer queimadas, foi prolongada a proibição até 31 de Outubro, há gente que não resiste a isso, que olha para os seus interesses pessoais", sustentou.
Vila Nova de Poiares accionou o plano distrital de emergência. O presidente da Câmara afirmava que a localidade estava a viver “uma situação dramática, com inúmeras frentes de fogo”. Ao final da tarde as chamas em Vila Nova de Poiares tinham destruído três casas, uma delas de primeira habitação. Em Monção, o comandante dos bombeiros solicitava mais meios. O vento forte dificultava o combate às chamas que se aproximavam da vila. Já o presidente da câmara de Cantanhede falava de uma “situação tremenda”. Às 18h50, três incêndios na região de Portalegre mobilizavam cerca de 160 bombeiros. Na zona de Pedrógão Pequeno a estrada nacional 305 estava cortada ao trânsito. O incêndio obrigara à evacuação de algumas aldeias.
Às 19h00 as chamas que lavravam em vários concelhos no norte e no centro do país obrigaram ao corte de 15 estradas, entre elas a A1 entre Albergaria e a Mealhada. Em Arganil, distrito de Coimbra, o presidente da Câmara descrevia uma situação “incontrolável”. "Há várias aldeias evacuadas. A situação está má. O fogo lavra com grande intensidade, em várias frentes", disse Ricardo Alves.
Perto das 20h00 a localidade da Praia da Vieira, na Marinha Grande, foi evacuada. Cerca de uma hora depois chegava a notícia de que as chamas tinham destruído o parque de campismo. O presidente da Câmara afirmava que a situação estava “muito complicada e incontrolável”. Entretanto, o incêndio que tinha começado durante a manhã no concelho da Lousã alastrou aos concelhos vizinhos. As chamas obrigaram ao corte do IP3 na zona de Penacova. Na localidade de Moinhos, as chamas atingiram duas casas, uma delas habitada por uma família. Em Serpins, uma empresa de madeiras e uma serração ficaram destruídas. Jaime Marta Soares, ex-presidente da Câmara de Vila Nova de Poiares e presidente da Liga dos Bombeiros, afirmava à RTP que a situação era “dramática”. Cerca das 20h20, a ministra da Administração Interna afirma que os “incêndios não deflagram assim”. Constança Urbano de Sousa aponta o dedo a uma “inadequação dos comportamentos das pessoas”. Em entrevista à RTP, a ministra acrescentou que já foi accionado o “mecanismo europeu de protecção civil” e pedida a cooperação "a Espanha e a Marrocos". “Apesar de todas as proibições, que foram prolongadas até ao final do mês, continuamos a assistir a muitas ignições que são provocadas pelas pessoas. As ignições não surgem do nada”. Em relação aos meios no terreno a governante frisa que “estão os que são possíveis”. “O sistema foi todo reforçado e vai continuar reforçado até ao final deste mês. Mas também é preciso que as pessoas adeqúem os seus comportamentos à situação que estamos a viver”.
A ministra confirma que as autoridades têm “indicação de alguns feridos ligeiros mas os dados estão a ser actualizados a todo o momento”. Constança Urbano de Sousa reconhece que além da “mão criminosa” poderá também haver falhas na prevenção e no combate aos incêndios.
Com o avançar da noite a situação ia-se tornando cada vez mais complicada. O vento forte que se fazia sentir dificultava o combate às chamas. O incêndio que começou de manhã em Vale de Cambra alastra a Arouca e os bombeiros tentam combatê-lo na localidade de Vela do Escariz. As chamas consumiram alguns anexos, máquinas agrícolas e uma vacaria. Algumas estradas municipais continuavam cortadas.
Às 21h00, mais de 20 estradas estavam cortadas, entre as quais a A1, A11, A25, IP3 e IP6. Os vários fogos que lavravam no concelho de Oliveira do Hospital levaram a Câmara municipal a activar o plano municipal de emergência. José Calos Alexandrino, presidente da Câmara, afirma que o concelho “está todo a arder”. Em Mortágua, uma unidade hoteleira situada junto à Barragem da Aguieira estava cercada pelas chamas. As chamas obrigaram ao corte das linhas ferroviárias do Norte e da Beira Alta. Na linha do Norte a circulação foi retomada cerca das 22h20.
Na Ericeira um fogo com duas frentes activas obrigou à evacuação de uma população. Um fogo com três frentes activas estava descontrolado em Óbidos. Os bombeiros no terreno estavam a proteger habitações nas aldeias de Casais Ladeira, Perna de Pau e Olho Marinho. Os bombeiros queixavam-se de falta de meios.
Às 21h35, o secretário de Estado da Administração Interna afirma que o presumível autor do incêndio em Vale de Cambra foi detido. Às 22h00 a Protecção Civil faz um novo balanço e revela que ainda estão activos 108 incêndios, combatidos por 5.397 operacionais, apoiados por 1.600 meios terrestres. “Destas 108 ocorrências, 31 assumem uma importância elevada, pelo tempo de duração que já apresentam e pelos meios que concentram. Pela complexidade que temos neste momento no terreno”, explicou Patrícia Gaspar. Estas 31 ocorrências concentram-se nos distritos de Aveiro, Braga, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria, Lisboa, Porto, Santarém, Viana do Castelo e Viseu.
Desde as 0h00 do pior dia do ano foram registados 443 incêndios florestais. “Os distritos mais afectados são os de Aveiro com 56, Braga com 38, Coimbra com 25, Porto com 120 incêndios e o distrito de Viseu com 36”, salientou Patrícia Gaspar. A Protecção Civil decidiu, numa reunião que contou com a presença da ministra da Administração Interna, manter o “alerta vermelho até às 20h00 de segunda-feira. Porque as previsões apesar de indicarem que poderemos ter uma noite menos complexa, com mais humidade relativa e amanhã já alguma precipitação. Estes níveis poderão não ser expressivos”. Meia hora depois chegava a notícia das primeiras vítimas mortais. Os 443 fogos florestais de domingo tinham provocado três mortos. Dois em Penacova, distrito de Coimbra, e um no concelho da Sertã, distrito de Castelo Branco. As três vítimas eram civis e as mortes aconteceram já durante a noite. Em Penacova, as duas vítimas mortais estavam num barracão agrícola, na povoação de Vale Maior, freguesia de Friúmes e Paradela da Cortiça. Na Sertã, uma pessoa foi apanhada pelas chamas na localidade de Vale do Louça. Na mesma localidade, também devido ao incêndio, registaram-se três feridos. O estado dos três feridos estava a ser avaliado no local pelas 23h00.
Em Mira, distrito de Coimbra, as chamas ameaçaram várias casas. Em Monção, a vice-presidente da Câmara afirmava que a situação estava cada vez mais grave. “O fogo continua descontrolado e há risco permanente para as habitações”. A população e a equipa de reportagem da RTP estavam “presos” no local. Toda a zona estava envolta pelas chamas. “Já temos 11 freguesias afectadas pelo fogo. Já demos ordem para evacuar o lar de idosos de Merufe e, durante a madrugada, vamos avaliar a evacuação do lar de Podame", afirmou Conceição Soares.
Cerca da meia-noite, a Base Aérea de Monte Real, no concelho de Leiria, foi aberta à população. Em Tomar duas localidades foram evacuadas “por precaução” devido ao fumo intenso. No concelho as chamas já tinham consumido “casas devolutas e barracões” e provocado ferimentos ligeiros a dois bombeiros. Na zona de Mafra as chamas obrigaram à evacuação de várias casas e provocaram ferimentos a um sapador florestal. O plano municipal de protecção civil foi activado. Os bombeiros no combate às chamas tentam evitar que as chamas atinjam as habitações. O incêndio foi dado como dominado cerca das 2h07 de segunda-feira.
Em Gouveia, na Serra da Estrela, a zona urbana foi atingida pelos incêndios e o presidente da Câmara afirmava que havia “registo de casas ardidas e de pessoas desalojadas. O autarca denunciava a falta de meios no terreno. "Não os vejo. Não há meios nenhuns", lamentou. Segundo Luís Tadeu, na zona de Gouveia, na Serra da Estrela, "está tudo a arder". As chamas consumiram quase 54 mil hectares de floresta.
Cristina Sambado
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Fonte: RTP Notícias
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