O excesso de chuva de Junho poderá ter comprometido uma boa parte das principais culturas portuguesas. O olival, a vinha e a horticultura parecem ser os sectores mais afectados, mas os prejuízos estendem-se também à pecuária.
À perspectiva de menor produção juntam-se maiores gastos nos tratamentos para salvar o que resta, devendo repercutir-se negativamente na bolsa do agricultor. Mário Abreu Lima, vice-presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), confirma "graves prejuízos" em diversas culturas, em resultado da pluviosidade e baixas temperaturas para a época, que alternaram com picos de calor esporádicos.
Mário Pereira, presidente da Federação de Agricultura de Trás-os-Montes e Alto Douro (FATA), socorre-se mesmo de um provérbio para retratar a situação "Água de São João tira o vinho e não dá pão". A olivicultura é um dos sectores onde se adivinha maior quebra de produção, já que se encontra na "fase da limpa", que é fundamental para vingar o fruto. Porém, "os prejuízos são mais graves em Trás-os-Montes do que no Alentejo devido a maior avanço daquela fase da floração", justifica Abreu Lima.
"Prevemos um mau ano de produção de azeite". O dirigente da FATA complementa que as oliveiras precisam, nesta época, de uma temperatura média "na ordem dos 20 graus" para poder concluir bem a fase de floração. "Com o tempo frio e húmido isso não acontece", explica.
No entanto, para o presidente da Associação dos Olivicultores de Trás-os-Montes e Alto Douro (AOTAD), António Branco, "o cenário ainda não é muito grave", embora admita que existam zonas localizadas onde haja inferiores perspectivas de produção.
Na viticultura, a principal preocupação relaciona-se com as doenças provocadas por fungos, como o oídio e o míldio. O problema estende-se de Norte a Sul do país, com especial incidência na Região Demarcada do Douro. "São doenças que proliferam muito rapidamente com este tempo", sustenta Abreu Lima, notando que "mesmo nas áreas tratadas não há eficácia dos produtos aplicados". "Se quiserem pegar nas uvas, os agricultores vão ter de reforçar bem o tratamento", acrescenta Mário Pereira.
De acordo com este último responsável, as hortícolas estão também a sofrer bastante com o excesso de humidade na terra. O problema alarga-se à pecuária, já que os fenos que estavam segados e prontos para enfardar ficaram muito mais húmidos, o que cria problemas de armazenamento. O mesmo acontece com a aveia que é armazenada para os animais comerem durante o Inverno. "Vamos recolher muito pouco e com má qualidade", lamenta o dirigente da FATA.
Na fruticultura não há, para já, notícias de prejuízos provocados pela chuva de Junho. António Nascimento, produtor de maçã e dirigente da empresa Frucar, de Carrazeda de Ansiães, sustenta que a situação "não é grave" e que, apesar de as grandes amplitudes térmicas verificadas não serem muito favoráveis para os pomares, e de a humidade estimular o aparecimento de algumas pragas, "não é nada que não se resolva com mais um tratamento".
Situações de graves prejuízos agrícolas são cada vez mais frequentes, seja por excesso chuva, secas prolongadas ou trombas de água e granizo. As alterações climáticas a que temos vindo a assistir nas últimas décadas, e que se adivinham cada vez mais severas, fazem o vice-presidente da CAP pensar na necessidade de um sistema de seguros agrícolas mais acessível ao agricultor.
"Infelizmente, está mais habituado a contar com a providência divina do que com a segurança dos homens", critica. Defende um sistema de seguros que coloque o lavrador "no mesmo pé de igualdade que outra qualquer actividade económica". Até agora, lamenta, tem demonstrado a sua "ineficácia", o que se verifica recorrentemente quase todos os anos em situações de intempérie, sem que depois exista uma cobertura directa dos prejuízos.
Junto do Governo, a CAP tem insistido que é necessário "repensar o sistema agrícola evoluindo para um modelo semelhante ao espanhol". Tal modelo implica a realização de um seguro para o rendimento da produção agrícola, o que garante capacidade de "subsistência digna do agricultor como a qualquer outro parceiro da actividade económica".
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Fonte: Jornal de Notícias
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