sexta-feira, 27 de junho de 2008

1859. Fenómeno atmosférico descoberto ao largo de Cabo Verde vai ajudar previsões climáticas

Ao largo de Cabo Verde, no ar cálido que varre as águas tropicais do Atlântico e é salpicado pelas ondas, decorrem, todos os dias do ano, reacções químicas que destroem um gás que todos conhecemos: o ozono. O fenómeno foi agora descoberto por cientistas britânicos e cabo-verdianos e, a confirmar-se o seu carácter global (os oceanos cobrem 70 por cento da superfície do planeta), poderá obrigar os especialistas a reverem os modelos utilizados para prever a evolução do clima no nosso planeta.
A equipa de Lucy Carpenter, da Universidade de York, Reino Unido, escreve na revista Nature que, naquela região, nas camadas de ar mais baixas, é destruída uma quantidade de ozono perto de 50 por cento maior do que previsto pelos mais sofisticados modelos climáticos actuais. A partir de um observatório instalado na aldeia piscatória de Calhau, 15 quilómetros a leste do Mindelo, na ilha de São Vicente, e de observações feitas com uma avioneta, os cientistas conseguiram, pela primeira vez, medir o fenómeno, sem interrupção, ao longo de um ano, de Outubro de 2006 a Outubro de 2007.
A química da atmosfera em geral, e a do ozono em especial, são pratos de digestão difícil para leigos. Mas num comentário na mesma edição da revista, Roland von Glasow, da Universidade de East Anglia, resume bem a importância do ozono: "O ozono", escreve, "é um gás atmosférico fascinante, com papéis diferentes conforme a sua localização.
Na troposfera [a camada inferior] é um gás de estufa e pode ser nocivo para os animais e as plantas. Mas o ozono da estratosfera (...) absorve os raios nocivos do Sol." O ozono também é importante, salienta, porque a sua destruição dá origem aos chamados radicais hidroxilos, moléculas altamente reactivas que "limpam" o ar, removendo um outro potentíssimo gás de estufa: o metano.
"Neste momento", diz Alastair Lewis, co-autor do estudo, em comunicado, "é uma boa notícia - há mais ozono e mais metano a serem destruídos do que se pensava -, mas o Atlântico tropical não pode ser considerado como um 'sorvedouro' permanente de ozono. (...) Bastaria um pequeno aumento dos óxidos de azoto vindos dos combustíveis fósseis e trazidos de Europa, África Ocidental ou América do Norte pelos ventos, para que o oceano passasse de sorvedouro a fonte de ozono".
Mas o que é que leva a esta destruição - natural - do ozono no meio do Atlântico? Os cientistas encontraram, no ar em contacto com a água, altas concentrações de monóxido de iodo e de bromo e concluem que são esses compostos que promovem a destruição do ozono. O primeiro provém dos aerossóis de água salgada que se misturam com o ar e o segundo das algas marinhas - e nos dois casos, as reacções decorrem sob a acção do Sol.
Contactado pelo PÚBLICO, John Plane, um outro co-autor, da Universidade de Leeds, disse-nos que o resultado é importante porque "os modelos da química do clima que tentam prever o futuro nunca serão fiáveis se não incluírem os processos naturais importantes". E também porque mostra que "as propostas para remover o CO2 da atmosfera alterando a produtividade do oceano, isto é, fertilizando-o com ferro, serão altamente perigosas enquanto não percebermos adequadamente o sistema natural".
Ana Gerschenfeld
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Fonte: PÚBLICO

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