domingo, 26 de fevereiro de 2012

3798. Medição mais precisa piorou sensação sobre mudanças climáticas

Chuva no início do dia, sol forte no meio da tarde e frio no começo da noite. Variações de temperatura são cada vez mais comuns e podem causar enchentes e queimadas espontâneas no cerrado. O uso do sistema de posicionamento global (GPS) e a instalação de estações pluviométricas em 98% das grandes cidades mundiais têm contribuído para a percepção da alteração nas temperaturas. A evolução na medição também pode ter influência na sensação de que a situação é pior hoje.
"As mudanças climáticas devem-se, não única, mas principalmente à acção do homem", afirma Saulo Rodrigues Pereira Filho, professor e coordenador de Ensino do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (UnB). Segundo o especialista, desde a primeira Revolução Industrial, no século XVIII, houve aumento da temperatura média do planeta, o que já causou o derretimento de 25% dos gelos do pólo norte. A grande questão é a emissão dos gases de efeito estufa (GEE), dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4), o óxido nitroso (N2O) e os perfluorcarbonetos (PFC's), na atmosfera terrestre. Das emissões globais, três quartos têm origem na queima de combustíveis fósseis para usos variados, e a fracção restante é originada pelo desmatamento.
No Brasil, no entanto, essa relação está invertida. "Aqui, 75% dos gases vêm do desmatamento e apenas 25% do uso dos combustíveis fósseis", afirma Pereira. A grande vilã brasileira é a fronteira de ocupação agrícola, que se estende em direcção à Amazónia. A floresta e o cerrado dão lugar à soja, à cana-de-açúcar, à pecuária e, assim, ao aquecimento global. Essa inversão também ocorre na Indonésia, na Malásia e nos países africanos, que têm a sua economia dependente da produção de bens primários. A seu favor, o Brasil também tem o facto de poupar petróleo e carvão ao optar por fontes mais limpas de energia, como hidroeléctricas, e o incentivo ao uso de etanol nos carros.
É fácil apontar os erros cometidos pelos homens, mas ainda não se pode quantificar exactamente a parcela dessas acções no processo de variação do clima. Para Modesto Guedes Ferreira Júnior, professor do curso de engenharia ambiental da Universidade Estácio de Sá, "além de os registos não serem feitos com tanta eficiência no passado, hoje existe consciência muito maior do que está a ocorrer. O terramoto no Japão, por exemplo, foi acompanhado pelo mundo todo quase em tempo real", explica.
O registo das temperaturas, explica Mozar de Araújo Salvador, meteorologista da Coordenação Geral de Desenvolvimento e Pesquisa do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), é feito por meio de termómetros nas estações meteorológicas em todo o mundo, e as suas leituras são feitas sempre nos mesmos horários padronizados pela Organização Mundial de Meteorologia (OMM). Como há várias décadas o tipo de instrumento e a metodologia de colecta de dados são as mesmas nos países associados a OMM, não seria correcto dizer que as alterações climáticas registadas hoje devem-se a novas tecnologias. "As variações climáticas são naturais, com anos mais quentes e outros mais amenos. Especificamente no Sul do Brasil, temos observado ao longo dos anos que há uma forte flutuação ano a ano", afirma Salvador.
Para o meteorologista, para se afirmar com precisão se existe uma tendência de elevação nas temperaturas e quantificá-la, seria necessária uma investigação específica com os dados dessa região. A avaliação, afirma o pesquisador da UnB, deve ser feita tomando-se como base milhares de anos. "Não basta olhar os últimos cinco, 10 nem 100 anos. Trata-se de um exame rigoroso das eras geológicas da Terra, desde o começo dela, o que chamamos de estudos paleoclimáticos", afirma. Para se analisar o clima, deve-se levar em conta o passado histórico, para conseguir enxergar um padrão e poder afirmar o que seja uma anomalia climática ou não.
Embora a discussão ainda esteja quente no meio científico, o professor de geografia e mestre em educação Francisco Djacyr Silva de Souza, autor do livro Preservação do ambiente: uma acção de cidadania, acredita que os alertas ecológicos foram dados, mas acabaram ignorados pelos governantes. Para ele, o sistema acaba por promover o uso excessivo dos recursos naturais que desencadeiam poluição, destruição de ecossistemas, desaparecimentos de mananciais, retirada da cobertura vegetal e diminuição da área verde. "É preciso mudar urgentemente a nossa mentalidade em relação ao planeta. É preciso ouvir as mensagens que o próprio planeta nos está a dar e que muitos não ouvem ou fingem que não ouvem", avalia.
Por outro lado, para Pereira, o caminho passa por uma alteração de atitude de todos os indivíduos, não só do poder público: "economia verde não basta, temos também que rever os nossos padrões de consumo". Paralelamente ao desenvolvimento de novas tecnologias que permitam a maior eficiência no uso de energia, segundo o pesquisador, a sociedade precisa reavaliar as suas atitudes. Uma vez que o consumo é muito impactante para o equilíbrio climático, o conselho é priorizar bens imateriais como opções aos produtos poluentes. Prefira investir na sua educação a comprar um carro, e faça bem para o planeta, afirma o pesquisador.
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Fonte: Portal Terra

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